
Capítulo 1
* Sob o olhar de Friendlyone:
Quando eu a conheci ela já era uma mulher poderosa. Não gostei dela. Nariz empinadinho. Odeio. A fama era de má, e eu quis acreditar nisso. Dela para comigo, estranhamente, havia uma certa doçura, mesmo gostando de me provocar. Eu não entendia aquilo. Acho que nem ela.
Um dia nos esbarramos na casa de uma amiga que tínhamos em comum. Mas não tinha outro dia para vir aqui? - pensei dando um sorriso amarelo. O fato é que a amiga demorou a aparecer na sala e fomos obrigadas a conviver por aqueles eternos instantes.
Ela imensamente desconsertada pela minha apatia, fixou o olhar na mesinha de centro onde descansavam alguns livros. Ao lado deles havia o que prendia a atenção dela: uma bonequinha de louça. De tão perfeita parecia ter sido feita à mão. Fiquei imaginando como poderia Geórgia, que eu considerava meio fútil, comprar algo tão delicado e de extremo bom gosto. Subitamente, ela, que me despertava tanto desprezo pela própria figura, decidiu interromper nosso silêncio.
- Eu trouxe isto da França. Uma lembrança para Geórgia.
- Delicada - disse eu sinceramente.
- Não gosto de bonecas - ela disse agora me olhando nos olhos.
O modo como ela me olhava causava em mim um sentimento adverso. Incomodava. Mas o fato é que achei aquilo estranho. Como pode alguém não gostar de bonecas e ainda assim presentear um outro alguém com uma? Ela, notando o quanto me deixou intrigada, mudou o assunto.
- Você é uma mulher muito inteligente para essa cidade. Não creio que irá se adaptar aqui.
- Quero muito que aconteça ao contrário. Minha família tem raízes aqui. E a fazenda... Gosto tanto. - Respondi pensando no quanto ela estava sendo intrometida. Odiava aquele jeito seguro dela de dizer as coisas. Falava como se já me conhecesse.
Geórgia finalmente apontou no corredor e nos recebeu animada. A bela mulher conversou com ela por cerca de dez minutos. Eu me distraia na varanda com as plantas de Geórgia quando a vi vindo em minha direção.
- Se não estiver ocupada na sexta gostaria muito de recebê-la em minha casa.
- Claro! - ensaiei um sorriso para ela.
E foi justamente naquela sexta-feira que comecei a conhecer a tal mulher que não era tão má quanto diziam.
Um dia nos esbarramos na casa de uma amiga que tínhamos em comum. Mas não tinha outro dia para vir aqui? - pensei dando um sorriso amarelo. O fato é que a amiga demorou a aparecer na sala e fomos obrigadas a conviver por aqueles eternos instantes.
Ela imensamente desconsertada pela minha apatia, fixou o olhar na mesinha de centro onde descansavam alguns livros. Ao lado deles havia o que prendia a atenção dela: uma bonequinha de louça. De tão perfeita parecia ter sido feita à mão. Fiquei imaginando como poderia Geórgia, que eu considerava meio fútil, comprar algo tão delicado e de extremo bom gosto. Subitamente, ela, que me despertava tanto desprezo pela própria figura, decidiu interromper nosso silêncio.
- Eu trouxe isto da França. Uma lembrança para Geórgia.
- Delicada - disse eu sinceramente.
- Não gosto de bonecas - ela disse agora me olhando nos olhos.
O modo como ela me olhava causava em mim um sentimento adverso. Incomodava. Mas o fato é que achei aquilo estranho. Como pode alguém não gostar de bonecas e ainda assim presentear um outro alguém com uma? Ela, notando o quanto me deixou intrigada, mudou o assunto.
- Você é uma mulher muito inteligente para essa cidade. Não creio que irá se adaptar aqui.
- Quero muito que aconteça ao contrário. Minha família tem raízes aqui. E a fazenda... Gosto tanto. - Respondi pensando no quanto ela estava sendo intrometida. Odiava aquele jeito seguro dela de dizer as coisas. Falava como se já me conhecesse.
Geórgia finalmente apontou no corredor e nos recebeu animada. A bela mulher conversou com ela por cerca de dez minutos. Eu me distraia na varanda com as plantas de Geórgia quando a vi vindo em minha direção.
- Se não estiver ocupada na sexta gostaria muito de recebê-la em minha casa.
- Claro! - ensaiei um sorriso para ela.
E foi justamente naquela sexta-feira que comecei a conhecer a tal mulher que não era tão má quanto diziam.
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* Sob o olhar de Luci:
Terça-feira, quinze para as quatro da tarde. O dia estava quente e Clara chegou cedo. Não havia trânsito. E não faltavam vagas para estacionar o carro naquela rua tão deserta quanto todas as outras da cidadezinha charmosa, mas pacata. Acostumada a calcular seu tempo baseada nas dificuldades do intenso tráfego de São Paulo, acabou chegando à casa de Geórgia bem antes da hora marcada.
Desceu com calma. Apreciou as flores do canteiro da rua. Coloridas e ingênuas: bucólicas como tudo por ali. Sentiu o ar puro e quase sorriu. Pegou, então, a bolsa grande que sempre a acompanhava e seguiu para a casa da amiga de infância, uma das poucas que ainda morava ali. Apertou a campanhia. Ventava. O ar quente queimava seu rosto moreno e dava nós nos cabelos cacheados, soltos e embaraçados. Ficou visivelmente irritada. Ouviu passos de mulher: o som picado do salto agulha. Olhou com cumplicidade para o seu tênis velho de guerra. Uma chave entrou na fechadura. Girou rápido. A porta abriu. Foi então que o doce sorriso de Clara ficou amargo. Não parecia mais um sorriso. A boca teimava fechar, mas ela continuava a mostrar os dentes. Tão contrariado aquele risinho sem graça.
Era Ana, a filha do prefeito da cidadela. Mulher alta, esguia, de ombros largos e pernas longas. Tinha os cabelos louros. Seu queixo era desenhado e seu vestido, azul piscina. Portava-se como uma rainha: o andar era seguro, mas suave. A voz rouca, mas firme.
Com um sorriso discreto, convidou Clara a entrar. Seguiram até a sala, onde se acomodaram à espera de Geórgia, que estava terminando de se arrumar.
Cada uma sentou em uma poltrona. Uma de frente para a outra. Em meio a detalhes minimalistas espalhados pelo cômodo bem decorado, um contraste se instalou com a chegada das duas mulheres: tão diferentes e tão bonitas. Cada qual com a sua delícia. Cada uma com a sua própria dor bem guardada. Clara deslizava as mãos pequenas sobre seu jeans surrado, num vai e vem apreensivo. Parou com o movimento irritante quando pairou o olhar sobre a boneca de porcelana que estava sobre a mesa de centro. Ana mantinha as pernas cuidadosamente cruzadas. Sua ansiedade era calculada. Mordia os lábios com delicadeza e conservava os olhos azuis fixos nos livros de arte, ao lado da boneca. Quanto desconforto. O silêncio estava prestes a gritar quando foi rasgado pela voz pujante de Ana, fazendo um comentário sobre a boneca de louça. Clara levantou os olhos. Respondeu curto. Sem sorrir. Sem qualquer esforço. Ana, ao contrário, demonstrava um interesse contido, mas verdadeiro, em agradar a moça. Tentava decifrar Clara. Seu olhar era um misto de admiração e curiosidade.
Então tocou naquele assunto: a volta repentina de Clara, depois de tanto tempo fora. Os olhos da moça ergueram-se depressa. Armados. Prontos para fuzilar Ana, sem piedade. Mas reprimiu sua revolta com uma resposta qualquer, interrompida pela chegada repentina de Geórgia, que entrou na sala sorrindo e falando ao mesmo tempo. Muito animada, como sempre. Abrandou o mal estar instalado.
Ana conversou rapidamente com Geórgia e, antes de sair, foi até Clara. Seus olhos azuis estavam sorrindo quando convidou-a para ir na sexta-feira à sua casa. Sonâmbula, Clara assentiu, sem perceber. Ana percebeu mas mesmo assim despediu-se com um sorriso verdadeiro. Saiu feliz e satisfeita. Clara ficou estática por alguns segundos, absorta naquele convite inusitado. Intrigada. Mas resolveu não pensar naquilo. Pelo menos por agora.
Na sexta-feira, decidiu deixar os rótulos de lado. Chegou à casa de Ana na hora marcada e foi recebida com um grande sorriso. Descobriu, então, que as coisas poderiam sim ser diferentes.
Desceu com calma. Apreciou as flores do canteiro da rua. Coloridas e ingênuas: bucólicas como tudo por ali. Sentiu o ar puro e quase sorriu. Pegou, então, a bolsa grande que sempre a acompanhava e seguiu para a casa da amiga de infância, uma das poucas que ainda morava ali. Apertou a campanhia. Ventava. O ar quente queimava seu rosto moreno e dava nós nos cabelos cacheados, soltos e embaraçados. Ficou visivelmente irritada. Ouviu passos de mulher: o som picado do salto agulha. Olhou com cumplicidade para o seu tênis velho de guerra. Uma chave entrou na fechadura. Girou rápido. A porta abriu. Foi então que o doce sorriso de Clara ficou amargo. Não parecia mais um sorriso. A boca teimava fechar, mas ela continuava a mostrar os dentes. Tão contrariado aquele risinho sem graça.
Era Ana, a filha do prefeito da cidadela. Mulher alta, esguia, de ombros largos e pernas longas. Tinha os cabelos louros. Seu queixo era desenhado e seu vestido, azul piscina. Portava-se como uma rainha: o andar era seguro, mas suave. A voz rouca, mas firme.
Com um sorriso discreto, convidou Clara a entrar. Seguiram até a sala, onde se acomodaram à espera de Geórgia, que estava terminando de se arrumar.
Cada uma sentou em uma poltrona. Uma de frente para a outra. Em meio a detalhes minimalistas espalhados pelo cômodo bem decorado, um contraste se instalou com a chegada das duas mulheres: tão diferentes e tão bonitas. Cada qual com a sua delícia. Cada uma com a sua própria dor bem guardada. Clara deslizava as mãos pequenas sobre seu jeans surrado, num vai e vem apreensivo. Parou com o movimento irritante quando pairou o olhar sobre a boneca de porcelana que estava sobre a mesa de centro. Ana mantinha as pernas cuidadosamente cruzadas. Sua ansiedade era calculada. Mordia os lábios com delicadeza e conservava os olhos azuis fixos nos livros de arte, ao lado da boneca. Quanto desconforto. O silêncio estava prestes a gritar quando foi rasgado pela voz pujante de Ana, fazendo um comentário sobre a boneca de louça. Clara levantou os olhos. Respondeu curto. Sem sorrir. Sem qualquer esforço. Ana, ao contrário, demonstrava um interesse contido, mas verdadeiro, em agradar a moça. Tentava decifrar Clara. Seu olhar era um misto de admiração e curiosidade.
Então tocou naquele assunto: a volta repentina de Clara, depois de tanto tempo fora. Os olhos da moça ergueram-se depressa. Armados. Prontos para fuzilar Ana, sem piedade. Mas reprimiu sua revolta com uma resposta qualquer, interrompida pela chegada repentina de Geórgia, que entrou na sala sorrindo e falando ao mesmo tempo. Muito animada, como sempre. Abrandou o mal estar instalado.
Ana conversou rapidamente com Geórgia e, antes de sair, foi até Clara. Seus olhos azuis estavam sorrindo quando convidou-a para ir na sexta-feira à sua casa. Sonâmbula, Clara assentiu, sem perceber. Ana percebeu mas mesmo assim despediu-se com um sorriso verdadeiro. Saiu feliz e satisfeita. Clara ficou estática por alguns segundos, absorta naquele convite inusitado. Intrigada. Mas resolveu não pensar naquilo. Pelo menos por agora.
Na sexta-feira, decidiu deixar os rótulos de lado. Chegou à casa de Ana na hora marcada e foi recebida com um grande sorriso. Descobriu, então, que as coisas poderiam sim ser diferentes.
4 comentários:
Bem interessante esse jeito de vocês escreverem...combinaram bem.
E eu fiquei curiosa..rs
Bjs.
pois é.. novos desafios são sempre inspiradores... parabéns!
Uau.. gostei da idéia de quatro mãos. quero ler mais.
beijos pras duas e inspiração pras 4.
C
Se duas mãos já produziam ótimas viagens, imaginem quatro.. uma história sem fim... parabéns, estou seguindo esta iniciativa com muito prazer, bjinhos... Anita
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